Mudei de endereço

Postar um comentário

terça-feira, 29 de abril de 2008

16/8

Pessoas as mais diversas têm me perguntado como estou. Não o olá-como-vai-eu-vou-indo-e-você-tudo-bem - mas aquele "como você está?" acompanhado de um olho no olho e às vezes um leve toque no meu braço.

Eu sempre me surpreendo com as tentativas alheias de transformar um dos greatest hits do falatório universal em fala autêntica. E sempre sinto que minha resposta não fica à altura do que o entrevistador pretendia. A resposta que acaba saindo oscila entre "é, um dia após o outro" e "sim, tudo bem, estudando bastante...".

A verdade é que meu espanto com essas perguntas de pessoas que se importam comigo tem me lembrado bastante o espanto que eu sentia quando me perguntavam a mesma coisa logo que minha mãe morreu. A diferença é que, naquela época, as pessoas não se contentavam com um leve roçar de braços - elas preferiam segurar-me firmemente pelos ombros. E minha reação nada tinha do atual reconhecimento de que a vida pode - a vida tem que - estar muito melhor: eu simplesmente exibia uma incompreensão total. "Como assim, está tudo bem? Claro que está - por que, não era pra estar?"

Aos dez anos de idade tomei uma decisão da qual luto para me livrar até hoje: decidi que eu não tinha direito e nem motivos para sofrer. Minha mãe morreu? E daí - tem gente que perde os dois pais, ué, muito pior. Tem gente que passa fome. Tem gente que fica surdo. Estas gentes sim, poderiam legitimamente ter acesso a algum sofrimento. Eu, não. Eu era tão sortuda! Podia ter acontecido coisa tão pior... E se fosse o meu pai, já pensou??

Poucos raciocínios são tão potencialmente destrutivos na vida de uma pessoa quanto o do podia ser pior. Ele funciona exatamente pela mesma lógica da compra a prazo: em vez de sofrer à vista, você escolhe fechar-se para todo e qualquer sofrimento agora, para sofrer a prazo depois. Só que com juros muito superiores aos do Banco Central.

Minha desilusão amorosa atual vem se constituindo como minha primeira experiência de sofrimento à vista. Paguei uma grana tão violenta para ela, que agora me encontro no seguinte ponto:

Estou bem. Passo os dias feliz. Estudo o que amo, ouço o que amo e abraço aqueles a quem amo. Dentre os quais certamente não se encontra mais meu ex-namorado. O amor por ele passou.

E é aí que começa a parte verdadeiramente chata: o fim do amor dá vazão a uma enxurrada de mágoa e ressentimento.

Não durante o dia - os dias vêm sendo deliciosos. No Rio, então, nem se fale - não há como não ser feliz na praia e com o Gabriel.

Mas à noite...

À mágoa e ao ressentimento de hoje soma-se o sofrimento a prazo de outrora.

Venho tendo pesadelos. Não quaisquer pesadelos - ah, se eu pudesse pesadelar com bicho-papão ou nudez pública! - mas os meus fort-da particulares. Dos quais o principal é - alguém arrisca um palpite? - ta-da, com minha mãe.

O enredo é sempre o mesmo (claro - pois se o sonho não é um sonho, e sim uma repetição):

Minha mãe na verdade não morreu. Ela se mudou para algum lugar distante (esse lugar já foi China, Rússia e até a Lua; no último pesadelo, não foi especificado), porque encheu o saco da sua vida aqui - bem-entendido, encheu o saco de mim - e foi viver uma vida mais interessante num lugar exótico.

Aí ela volta, para me visitar (às vezes por algumas horas, outras por alguns dias; o máximo a que chegou foi uma semana). De início, mostra-se gentil, calorosa e demonstra sincero interesse em mim e meus afazeres.

É esse o pior momento do pesadelo. Porque me é simplesmente inconcebível uma alegria maior do que ver MINHA MÃE RESSUSCITADA. E a emoção é tanta que, nessa parte do enredo, eu choro e choro, e a abraço e beijo - e, quando consigo começar a esboçar alguma fala...

Ela avisa que vai embora.

(Começa o desespero.)

Eu grito com ela.

Sacudo, chacoalho, bato.

Na verdade, nunca consegui bater pra valer - porque, nessa hora, o choro se intensifica, e me tira completamente o tônus muscular.

No menos pior dos pesadelos, ela fica simplesmente fria. (Morta.)

No mais pior, ri de mim com escárnio. (Morta-viva.)

Anteontem foi assim.

Têm sido assim todas as noites. Geralmente não lembro o conteúdo do pesadelo - mas acordo sempre com a mesma sensação.

Que tem um só nome: abandono.

O não valer nada e ser trocada por coisa melhor.

Mas então me recupero, e passo o dia com meus amores.

Em dezesseis horas das vinte e quatro que a Terra nos concede, portanto, vou indo muito bem, obrigada.

As outras oito têm sido de puro pavor.

Torço por uma mistura e uma diluição das 8 nas 16.

Marcadores:

Postar um comentário

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Lista de presentes atualizada

Afinal de cuentas:

1) Perguntar não ofende, sobretudo quando no seu próprio blog;

2) Quem não arrisca não petisca, quem tem boca vai a Roma, quem está na chuva é pra se molhar, os brutos também amam, ops!, próximo item;

3) Meu aniversário não foi devidamente comemorado cá por estas plagas;

4) Eu resolvi que eu mereço, isso conta como motivo?

Então, se você for podre de rico e não souber mais o que fazer com tanto dinheiro - por que não me dar um livro de presente? Ficarei muito feliz em contribuir para a melhoria da distribuição de renda no Brasil. Se, por outro lado, você for pobre de marré e estiver economizando até no papel higiênico - por que não me dar um livro de presente? Gastar com um supérfluo quando o essencial lhe oprime a alma fará com que você se sinta mais livre e feliz. Portanto, seja pela sua ou pela minha felicidade, a lista atualizada encontra-se aqui.

Postar um comentário

Que barraquinha de coco, o quê

A melhor profissão do mundo é a de redator de legendas do uol (via Pedro Dória).

Postar um comentário

Melhor notícia musical do ano

Enquanto me livro da areia de Macaé, deixo os estimados leitores com nove minutos e quinze segundos de êxtase:



Vamos deixar claro o seguinte. A Brian Blade Fellowship é uma das minhas três bandas preferidas em atividade (um salgado para quem adivinhar as outras duas). E hoje simplesmente descobri que em oito dias eles lançam disco novo. Com turnê (palavra horrível, que me lembra o carnê do baú, mas deixa pra lá) de lançamento e tudo. Com o detalhe de que BB é nativo do estado da Louisiana - informação que me seria de todo inútil até dois meses atrás, mas acaba de ganhar tremendamente em relevância por sua seguinte decorrência lógica: se ele é de lá, é mais do que provável que queira lançar o disco por lá. Quem sabe até em NOLA... Mas se não rolar - Greyhound, aí vou eu.

Morar nos EUA nunca me soou tão atraente quanto agora.


***

P.S.: É claro que outras notícias podem superar esta ao longo do ano. Tipo: o PMG pode voltar a gravar com o Pedro, a Joni pode fazer uma turnê mundial com orquestra regida pelo Vince Mendoza, a Mônica e o André podem finalmente registrar o duo deles, o Keith Jarrett pode voltar a compor, o Milton pode ressuscitar e o Frank Sinatra pode vir para o Brasil. Nunca se sabe...

Postar um comentário

sábado, 26 de abril de 2008

Alguns pontos que merecem registro imediato

1-) Já fomos à Lapa ouvir uma banda de gafieira que, apesar de estar apenas começando, já dispõe de belos e bem ensaiados arranjos; fomos também à Lapa de Macaé ouvir um samba e choro com um dos melhores 7 cordas do Brasil (e o Gabriel deu canja!); mas quando virou meio que um pagode, deu sono.

2-) Entre quinta e hoje, passamos pelo menos umas oito horas na praia, aqui no Rio e em Macaé - andando, conversando, dormindo, tomando caldos da ressaca e comendo biscoitos Globo. Dizem que andar de bicicleta a gente nunca esquece, e ainda não tive chance de constatar a veracidade desta afirmação; mas posso assegurar que, no que diz respeito à praia, um aforismo desse tipo faz todo o sentido (e tudo bem que ir à praia não exija nenhuma habilidade específica). Estive pelo menos uns dois anos enfurnada em espaços urbanos e é impressionante como quinze minutos de praia são suficientes para me convencer de que eu poderia ser feliz gerenciando uma barraquinha de cocos.

3-) Já brindamos o nosso futuro e o nosso presente, no meu momento preferido da viagem até agora: quinta à noite, quando ficamos em casa e ouvi o disco do Gabriel.

4-) E por falar nisso, minha futura lista dos dez melhores discos de 2008 acaba de virar uma futura lista dos nove melhores discos de 2008, porque o do Gabriel já tem vaga garantida lá.

5-) O disco me emocionou particularmente pelo seguinte. Existem milhares de guitarristas pelo mundo que adoram o Pat. E tocam a mesma guitarra que o Pat. E se vestem igual ao Pat. E aprendem todas as músicas do Pat. Etc. Mas existem poucos, pouquíssimos músicos - não só guitarristas - cuja influência do Pat se percebe nitidamente, e que nem por isso são imitações mais ou menos verossímeis do Pat. O maior e mais claro exemplo que tenho disso é o E.S.T., que une a evidente influência do PMG à música pop e eletrônica. E agora tem o Gabriel, fazendo isso com a música brasileira em geral e o samba em particular. É muito bonito. E é novo.

6-) Então ficamos ouvindo um PMG ao vivo na França de 92 ou 93 - o show do The Road To You - e cantando junto os solos que se mantiveram, pirando nas diferenças dos que se modificaram, rindo dos erros e da bateria medonha em alguns trechos, caçando detalhes de mixagem, nos arrepiando com o Pedro, escolhendo que música deveria ter substituído a bobinha Beat 70 no The Road, discutindo as versões preferidas de cada música, nos emocionando com o timbre da Gibson, com os gatinhos do Lyle, com os whistles, com os climas de Half Life of Absolution - nos emocionando com tantas melodias que já fazem tão parte da gente quanto uma boca ou um olho.

7-) Existe uma mística em torno de cafés-da-manhã de hotel. Por mais simples que sejam, são sempre especiais. Hoje não foi diferente.

8-) Aliás, hoje o almoço mineiro foi de deixar qualquer nutricionista barbarizado. E o de ontem também. E o de anteontem. E, ainda assim, eu continuo me achando bonita. Sinceramente, não sei de onde vem tanta auto-estima.

9-) O mundo parece se dividir entre a) os que acham que Gabriel e eu namoramos; b) os que acham que Gabriel e eu deveríamos namorar. Não perdemos tempo nem gastamos saliva debatendo estas idéias.

10-) O clichê "Fulano / a música X gruda que nem chiclete" nunca me pareceu tão ultrapassado e urbano. Quem diz isso não sabe nada da vida, como eu mesma não sabia até quinze minutos atrás. Aprendam com a voz da experiência: o certo é dizer "Fulano / a música X gruda que nem a areia de Macaé".

11-) Outra comparação preciosa: "tocar com fone é que nem transar de camisinha!". A metáfora da bala com papel fica desde já declarada, portanto, sumariamente ultrapassada.

12-) Fui convidada a escrever o release do disco do Gabriel. Estou morrendo de orgulho, de excitação e de medo.

13-) Vir para cá foi das minhas idéias mais brilhantes dos últimos tempos. Quem disse que reencontrar uma pessoa querida não é coisa que brilhe?

Postar um comentário

terça-feira, 22 de abril de 2008

Minha alma canta

E daqui a pouco verei o Rio de Janeiro. Vou ficar com o Gabriel; juntos mataremos a saudade; entornaremos algumas garrafas de vinho (e, certamente, uma de champanhe); conversaremos sobre the state of music business e novas descobertas musicais; ouviremos obras completas do Pat; ouvirei-o tocar A Noite, Somos Todos Iguais Esta Noite, Secret Story e outros discos, do começo ao fim; ouvirei o disco inédito dele; falará mal de mulheres ele, falarei mal de homens eu; farei campanha pelo Gabeira; farei campanha contra a dengue; irei à praia, à Lapa, ao Jardim Botânico; superarei minha vergonha de sambar à vista de cariocas; encontrarei dois amigos blogueiros; escreverei bem pouco aqui no blog.

Bom resto de semana aos que ficam.

Postar um comentário

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Raciocínios que assustam

Existe um tipo de reação que sempre me incomoda muito toda vez que alguma tragédia criminal ocupa o centro das atenções da mídia. Algumas pessoas se incomodam com o destaque em si - com o circo que se arma em torno da tragédia.

O circo é uma instituição que, dentre tantas outras, nunca fez parte da minha vida. Exemplos: nunca peguei carinhas na balada, nunca segurei o tchan, nunca parei para ver acidente na estrada e nunca me interessaram os detalhes dos laudos técnicos referentes ao assassinato da menina Isabella. São coisas que simplesmente não me interessam. Não são essas as vias que utilizo para (nos dois primeiros casos) expressar a minha sexualidade nem (nos dois últimos) minha empatia e solidariedade para com outros seres humanos. Mas não me surpreende nem me indigna que estas sejam as vias de expressão adotadas por outras pessoas. Em nada me incomoda, no que se refere à tragédia de agora, que ela ocupe a primeira página dos jornais há semanas. Se é o que as pessoas querem consumir, é o que o jornal oferecerá. Simples assim.

Mas incomoda-me muito, incomoda-me de verdade, o seguinte argumento: "todo mundo fica aí falando dessa menina assassinada, mas se ela fosse preta e pobre queria ver se ia dar esse rebu todo!"*.

Porque essa reação pode até demorar um tempinho para aparecer, mas é como o recalcado: sempre retorna. Quando Marcelo Frommer foi assassinado, veio a pergunta: e se fosse sambista? Quando Liana Friedenbach foi assassinada - e se não fosse judia?

Eu sinceramente não entendo o que esse tipo de argumento pretende demonstrar.

Que está errado deixar-se indignar por assassinatos cometidos contra pessoas de classe média/brancas/roqueiras/judias? Que indignantes mesmo são os assassinatos cometidos contra pobres/pretos/sambistas/não-judeus?

Socorro.

*Fonte: conversa de corredor.

Marcadores:

Postar um comentário

domingo, 20 de abril de 2008

Comunicadinho

Amigos,

Esta blogueira voltou a render-se ao MSN. Agora só falta o MSN render-se a ela: não tenho o endereço de quase ninguém. Portanto, guapos y guapas, adicionem-me! Sou recordarrepetirelaborar@hotmail.com e explorar novos/velhos gadgets de comunicação online faz parte de meu projeto "vida-feliz-em-NOLA".

Aguardo, pois, janelinhas piscantes em minha tela.

Postar um comentário

Frase do dia

"Always treat yourself as you'd like others to treat you."

(De algum personagem não-identificado do CSI da cidade do Grissom - porque a sabedoria pode estar em qualquer lugar.)

Postar um comentário

sábado, 19 de abril de 2008

Festinhas e festança

Breve pausa nas fotos de NY e NOLA para registrar momentos felizes de uma festança e duas festinhas:



Um dos sentimentos mais gostosos de se experimentar é a felicidade por alguém que se ama. Poucas vezes vivi esse sentimento com tanta intensidade quanto no casamento da Lili (Sydney).



Cidade dos Doces: um jardim com terra fértil e uma plantação de lírios. Mais adiante, em destaque, a praça da matriz. À direita, confabulam senhoras de vestidos prateados e rendados. Ao fundo, uma manifestação popular: pessoas salgadas reclamam sua inclusão na Cidade dos Doces. Antes que suas reinvindicações pudessem ser atendidas, porém, a Cidade foi devastada. Encontro-me entre os principais responsáveis pela tragédia.



Este blog registra um momento histórico: Lu e seu primeiro salame em nove anos.



Minhas amigas e colegas de trabalho: ao meu lado, Ju, Nath, Marina, Dani e Aline. Não estão todas aí, mas esta foto já foi suficiente para me angustiar um bocado. Ela representa simplesmente o que de mais importante irei perder, com a partida para New Orleans. Família, amigos e mesmo a Psicanálise - tudo isso continuará bem próximo a mim, apesar da distância. Mas deste grupo de trabalho, estou de fato me despedindo, bem como de pacientes antigos e novos encaminhamentos. Ainda não dá para escrever sobre nada disso. Por ora, apenas a foto.



Vocês reconhecem o vestido aí da mala?



Eu e Nath, morenas sestrosas, na foto errada que deu certo.

Marcadores:

Postar um comentário

Racistas, nós?? Magina, quéisso...

Eu ia escrever um texto comentando algum aspecto da série de posts do LLL sobre o racismo, mas duas frases ouvidas anteontem foram o melhor argumento que encontrei para que esta série seja divulgada para o maior número de pessoas, e já:

1) O grande problema da Espanha são os negões africanos.

2) Todo mundo fala em preconceito contra os negros, mas eles é que são preconceituosos! Têm o maior preconceito contra os brancos!

Ou seja: I rest my case. Estou convencida de que na base de todos os problemas da humanidade está a incapacidade de se colocar no lugar do outro. Uma falta de imaginação crônica assola a todos nós, gerando desde comportamentos idiotas como babar no suco alheio até violências inacreditáveis como as frases acima.

Isto posto, informe-se com os seguintes textos e assuste-se com suas caixas de comentários:

Usos do Nego
Quem Sabe da Ofensa é o Ofendido
Ser da Raça Certa I, II, III e IV.

Postar um comentário

Carta a mim mesma no futuro

Querida Camila,

Posso dizer que lhe conheço razoavelmente bem, ainda que não tenhamos sido apresentadas; faltam-me, no entanto, alguns dados, todos periféricos ao objetivo desta carta. Não sei quantos anos você tem, onde mora ou o que faz da vida. Sei, não obstante, que algumas coisas permanecem: o amor à música e o horror às uvas passas; o espanto com o ser humano; seu pai, suas tias, sua avó e a Bel. Provavelmente permanecem também coisas que aos 26 anos você não imaginava que seriam duradouras nem tampouco constitutivas da sua personalidade. E permanecem, se tudo correu bem, alguns desejos formados ao longo de muitos meses de gestação psíquica.

Por exemplo, o desejo de amores. Que universo pode estar contido em duas desenxabidas letras: ES. Você largou o osso, Camila. Abriu mão de um amor natimorto para se dedicar a amores vivos. Esta é uma conquista de cuja importância só você pode saber. A partir dela, você virou adulta, sem volta e sem desculpas. Você ficou livre para se deixar prender mais uma vez.

E com isso você sofreu. O momento em que lhe escrevo foi quando você se deu o direito de sofrer - de sofrer de verdade. Porque você se abriu por completo ao prazer, sem medo dos riscos que isso lhe acarretava. E, agora que as amarras que a prendiam foram cortadas, você pôde dimensionar o tamanho daqueles riscos - proporcional à honestidade da sua entrega. Então você se sentiu feliz, e não quis outra coisa para a sua vida: você desejou, para sempre, poder amar desse jeito. Agora, neste passado que não tenho como saber se lhe é recente ou distante, você descobriu o prazer de se desamarrar. Porque é só isso, e apenas isso, o que lhe permite amarrar-se de novo. E muito lhe apraz estar amarrada.

Então, Camila, se por acaso você estiver novamente passando pelo processo de se desamarrar - não importa quem tenha desfeito o(s) nós - eu gostaria de lhe lembrar algumas coisas que me têm sido extremamente prolíficas. Coisas práticas que têm-me feito melhorar. Desamarrar por completo, não sei quando; sei que isso já terá acontecido há muito quando você estiver a ler esta carta, mas agora me é impossível dimensioná-lo. Não importa. Importa lembrar-lhe que você se cuidou e deixou-se cuidar neste momento crucial de agora. Afinal, não deixo de estar vivendo uma segunda gestação psíquica, e gestações não se controlam; no máximo, faz-se o pré-natal com um analista. Dizem que o segundo parto costuma correr melhor que o primeiro, devido à menor ansiedade da mãe. Imagino que seja verdade. Assim como imagino que Houdini deve ter ganhado muito em rapidez e agilidade ao longo de anos de desamarração. E percebo que não consigo me decidir entre uma metáfora e outra, pois ambas se completam: é desamarrar aqui para gestar uma pessoa nova - eu mesma - lá.

Seguem então algumas dicas - não de analista, de parteira mesmo - do que você pode tentar fazer da próxima vez em que viver um processo semelhante. Tenho certeza de que, até lá, você terá criado outra metáfora para designá-lo.

- Leia. Muitos livros ao mesmo tempo, de diferentes autores. Converse. Com muitos amigos, que trazem diferentes histórias. Retome. As filmografias do Bergman e do Fellini. Envolver-se com outras pessoas (reais ou inventadas), além de ser o que mais lhe interessa na vida, terá nesta hora a vantagem de ampliar a sua perspectiva sobre o seu próprio sofrimento. Assim será mais fácil se lembrar de que seu umbigo não está para o universo assim como a estação da Sé para o metrô de São Paulo.

- Não deixe de retornar ao seu umbigo. Não é necessário fingir que está tudo bem. Não tenha medo de reconhecer que está tudo muito estranho, e que você não sabe quando deixará de estar. Não tenha pressa de que a estranheza passe - e, se tiver, não se culpe por isso.

- Estude um novo idioma. Mergulhe na gramática. Descubra novas estruturas gramaticais - descubra que há modos diferentes de pensar. Há modos diferentes de ser.

- Deixe que lhe papariquem. Que sua família e suas amigas a visitem e lhe tragam sorvete.

- Fique sozinha. Reserve a sexta à noite para não se sentir obrigada a nada.

- Cozinhe para si própria.

- Tome um vinho diferente por semana.

- Ouça discos antigos. Os mais amados. Afinal, você já está lendo, vendo e aprendendo coisas novas o suficiente. É preciso retornar a si própria em algum momento. Ouça apenas o que você sabe de cor, e cante junto (daí a necessidade da solidão.) Aos poucos você verá como é fácil inverter os versos de mestre Marçal: não choro mais / meu consolo é cantar.

- Reencontre uma pessoa amada. Uma de quem você saiba que qualquer separação, mesmo que dure anos, é apenas temporária.

- Ouça discos antigos. Mais, e de novo. Deles você não terá de se separar, nunca.

- Escreva no blog. (Espero que você ainda tenha um blog.) Ficou ruim? Ótimo, blog é para isso mesmo. Ficou bonzinho? Melhor: é capaz que alguém se deixe tocar pelo que você escreveu.

Espero que esses conselhos lhe sejam de alguma ajuda. Mas se não forem, no pasa nada: o importante é que eles estão me ajudando agora. É preciso apenas que uma coisa esteja bem clara: você é capaz de melhorar. É só se lembrar de mim. Lembrar que, no primeiro dia, você conseguia fazer bem pouco mais que chorar.

E, quinze dias depois, você já podia escrever esta carta.

Marcadores:

Postar um comentário

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Pior que furacão

Diálogo verídico saído do forno:


Eu: Então quer dizer que vou poder me abrigar do furacão lá na sua casinha em Austin.

Gabriel: Sim, e vice-versa.

Eu: Claro, mas... Como assim, tem furacão no Texas?

Gabriel: Não, muito pior: tem o Bush.

Postar um comentário

quarta-feira, 16 de abril de 2008

As vidas giram, giram, e às vezes param no mesmo lugar

... então Gabriel e eu ficamos uns dois anos sem se falar (as bobagens que a gente faz consigo mesmo/a); aí eu escrevo um raio de um post sobre o Pat, ele lê e pensa "é isso! é isso!" e comenta; no que digo a ele: baiano, vamos nos encontrar?; ao que ele responde, vem logo pra cá, meu!

E por isso hoje conversamos uns dois minutos pelo telefone - mas a Telefonica insistirá em cobrar uma hora de ligação - e elencamos alguns dos principais fatos que atualmente dão as cartas das nossas vidas:

- eu vou pra Tulane em New Orleans fazer mestrado e doutorado em setembro;

- ele vai pra Universidade do Texas em Austin fazer doutorado em setembro;

- eu tive um troço que nem é meu trabalho reconhecido por um cara meeeeeeeeega legal;

- ele está tendo o trabalho dele reconhecido por uma galera que só de eu ouvir ele me contar me emocionou até as lágrimas. Tipo assim, gente, ele gravou com o ODAIR ASSAD, tão entendendo o que é isso? Ou melhor: o ODAIR ASSAD gravou com ele, no disco DELE, de GABRIEL SANTIAGO. É nessas horas que dá vontade de dizer "eu já sabia", e desde julho de 1999; mas em vez de ficar dizendo isso, vou tratar de conter a minha ansiedade para ouvir o disco todo com calma e escrever a respeito com mais calma ainda aqui no blog;

- eu me apaixonei por e namorei uma criança;

- ele se apaixonou por e namorou uma criança;

- quando eu estava viajando (pra NY e NOLA), senti a criança meio estranha, e quando cheguei (em São Paulo), a criança fugiu.

- quando ele estava viajando (pra Ilhéus), sentiu a criança meio estranha, e quando chegou (no Rio), a criança fugiu.

***

Em 2003, ele comprou uma garrafa de champanhe para abrir quando entrasse no doutorado.

Esta garrafa será aberta semana que vem. Para comemorar não um, mas DOIS doutorados.

Afinal, nós merecemos. E nos amamos - e nos amamos um ao outro.

Postar um comentário

terça-feira, 15 de abril de 2008

Fotos musicais NOLA, parte 1

Vista do segundo andar do COSEAS (será que um dia eu aprendo o nome do prédio e deixo de chamá-lo de COSEAS?). No meio da tarde, uma banda de blues no pátio tão aleatória quanto ótima. Uma das coisas que mais me encantaram em New Orleans é que a música não precisa de motivo para acontecer.



Na abertura da BRASA, Chris Dunn, professor e gato. Toda instituição de ensino tem o seu - bem como a mocinha semi-psicótica que tem certeza de que o professor e gato está a fim dela (e só não descobriu isso ainda). Não raro a mocinha semi-psicótica incita-me a ser sua conselheira amorosa - é a personalidade não-psicótica da mocinha querendo ser chamada à realidade via um "amiga, vai procurar a sua turma". But I digress. Importa assinalar aqui que acho que vou me divertir muito no curso de música brasileira oferecido por ele - que, aliás, fala português melhor do que eu e você - e pelo Idelber. E também que ele organizou um congresso dos mais bacanas. E que eu fiquei feliz da vida em ter podido ajudar um micro-pouquinho na organização do evento.



É difícil pensar em lugar pior para ouvir música do que congresso: o nível costuma ser de Scala FM pra baixo. Grandes clássicos do rock e da MPB reinterpretados por ursinhos pimpões da Disney - é mais ou menos essa a imagem que música-de-congresso (prima-irmã da música-de-elevador e tia-avó da música-de-dentista) costuma me suscitar.

Pois a BRASA revolucionou meus conceitos sobre música-de-congresso ao contratar a Vavavoom para tocar durante o coquetel e o almoço do dia seguinte. É um som que, hmm, a única referência que consigo pensar para dar é o Django. "Gypsy jazz swing", diz o site deles, e me parece acertadíssimo. É isso mesmo: um jazz bem folk lá dos primórdios trazido para a nossa realidade, para um repertório em que convivem Duke Ellington e Luiz Bonfá (e mais uma porção de outras músicas que nunca ouvi mais gordas e que agora é imperativo conhecer).

O único momento em que ouvi música ruim em New Orleans foi quando chegou a vez do inevitável grupo de samba brasileiro. O grande problema do grupo de samba brasileiro não é nem o Brasil, nem o samba, nem mesmo o tchan que eles insistiam que deveria estar bem seguro e amarrado: o grande problema do grupo de samba brasileiro é o engenheiro de som brasileiro. Sabe aquelas refeições para quinhentas pessoas em que o arroz invariavelmente acaba pegando o gosto da carne, que pega o gosto do alface, que pega o gosto do tomate, que por sua vez pega o gosto do arroz? Pois o engenheiro de som brasileiro tem o dom de fazer o cavaquinho pegar o gosto do pandeiro, que pega o gosto do violão, que pega o gosto do surdo que pega em cheio no seu peito, te impelindo com toda a força para bem longe do tchan.



Kermit Ruffins no Vaughn's. Foi legal, foi bacana - principalmente pela ótima companhia de Idelber e sua turma. Mas só vou voltar se for para levar alguém. Sozinha, não tem por quê. Eu gosto de ouvir música, e aquele lugar é uma balada. Uma balada com o ótimo atrativo de ter boa música - mas, além de não ser uma música que me revire o cérebro (toca-se, basicamente, blues, e senti uma falta danada de um baixo acústico ali), ainda assim é uma balada, em que as pessoas vão para pegar e ser pegadas, beber e fumar sem se importar com a polícia. Em suma, tudo muito longe de me interessar. Com exceção da música, que estava legal, sim.

Agora, música mesmo fui ouvir no último dia, em que fomos - Alex, Paulo e eu; do Paulo falo já já - ver o quinteto do Delfeayo Marsalis. Para quem não sabe, os Marsalis são tipo a família Caymmi dos estado-unidenses: cada um ali toca alguma coisa e todos são mais ou menos excelentes no que fazem. Com a diferença de que os Caymmi têm três gênios e os Marsalis um só: o saxofonista Branford, que todos devem conhecer dos discos do Sting. Aliás, nunca consegui me decidir pelo solo de saxofone improvisado mais bonito da história da música popular. Mas cheguei a um top 3, em ordem não-especificada:

Branford Marsalis em Englishman in New York, do Sting
Nivaldo Ornelas em Beijo Partido, do Milton Nascimento (música do Toninho Horta)
Michael Brecker em Don't Let Me Be Lonely Tonight, do James Taylor

Voltando. O Branford, além de gênio, é meio do contra - porque o cara politicamente mais importante de sua família é seu irmão mais novo Wynton, trompetista tão competente quanto chato. Foi ele o grande difusor daquelas idéias ultra-manjadas de que o jazz morreu na década de 60 e é preciso resgatar os valores do passado e zzz... (Dêem uma olhada - melhor ainda, cliquem - na listinha aí do lado para vocês verem o quanto essas idéias me comovem: rigorosamente nada.) Moral da história: enquanto Wynton faz discursos apocalípticos, toca o Lincoln Center e se torna o principal porta-voz do jazz no mundo, Branford grava com Sting, expande as fronteiras do jazz e toca cada vez melhor. (O Wynton até toca bem, mas faz cada disco chaaaaaaaato...)

Mas, enfim, o show que vi não foi nem de um nem do outro, e sim do irmão menos famoso Delfeayo, trombonista. E, Jesus, que timbre. E que seção rítmica. Mais um baixista que caiu da grande árvore dos baixistas, um baterista que respondia fração-de-segundo a fração-de-segundo a tudo o que vinha de todos os lados e um pianista que sabiamente tocava com as duas mãos (se tem coisa que me irrita é pianista de jazz cuja mão esquerda fica mortinha nos apoios - geralmente intervalos de quinta - enquanto a direita corre para lá e para cá toda serelepe). O som? Mais convencional, impossível: exposição do tema (eventualmente precedida de introdução), dois ou três chorus pra um, dois ou três chorus pra outro, re-exposição do tema e estamos conversados. Formalmente, tudo muito previsível - mas não tenho nada contra essa previsibilidade do jazz. Tenho alguns amigos que não agüentam mais, e aliás o Eberhard Weber também não. Eu gosto e acho esse universo bem rico, a despeito das limitações formais. Filosofadas à parte, vão lá ouvir este show que achei no youtube. Obviamente, o som parece saído diretamente da piscina e rolam umas edições criminosas - ainda assim, vale pela maravilha que é esta formação.

Moral desta outra história: hei de bater ponto no Snug Harbor toda semana.



Na parede do Vaughn's, diversas representações da Flor-de-lis (valei-me, Deus...), símbolo da cidade. Música que a Kate McGarry cantou em português e inglês lá no 55. Vontade de escrever que o ciclo se fecha.

Marcadores:

Postar um comentário

segunda-feira, 14 de abril de 2008

O fim dos tempos

Meio-dia e meia, restaurante self-service na região da Paulista. Ao lado dos doces, várias jarras de suco. Uma senhora bem-apessoada se pergunta em voz alta:

- Hmm, será que já tem açúcar no suco?

PAUSE.

Pergunto: o que vocês acham que aconteceu depois disso?

Dou-lhe uma: a senhora perguntou se tinha açúcar no suco para a garçonete.

Dou-lhe duas: a senhora despejou um pouquinho do suco num copo para descobrir a resposta por si própria.

Dou-lhe três: a senhora desencanou de tão relevante questão, encheu um copo de suco e só foi descobrir se tinha açúcar ou não já na sua mesa.

PLAY.

A senhora provou do suco com a colher que estava dentro da jarra, devolvendo-a ao interior desta logo em seguida.

FAST-FORWARD.

Meia-noite e meia, apartamento aconchegante e bem distante da Paulista. Começo a temer que os freqüentadores de self-service passem a limpar os restos de seus pratos diretamente no bufê; que os republicanos vençam nos Estados Unidos; que eu seja abandonada mais uma vez.

Socorro.

Marcadores:

Postar um comentário

domingo, 13 de abril de 2008

O problema do sexo

ATENÇÃO: Este é um post ranzinza, pentelho e xexelento*. Que reclama da vida a cada parágrafo. Portanto, se você acha que reclamar da vida é injusto para com Deus e os anjinhos - "afinal, você tem saúde, e é isso que importa!" -, nem perca seu tempo.

***

Todo fim de relacionamento traz o inconveniente da falta de sexo.

Relativizemos a afirmação acima. Alguns términos de relacionamento vêm justamente para possibilitar a retomada da vida sexual dos (ex-)namorados.

Não é este o meu caso agora.

O Alex, futuro colega de classe e atual amigo indispensável, disse que deve ter transado mais (e com mais pessoas) nos cinco meses que antecederam sua partida para NOLA do que em toda sua vida pregressa.

Por quê? Porque a mulherada que até então ficava na dúvida se devia dar para ele ou não viu em sua partida um sinal dos céus: é agora ou nunca.

Otimista e bem-intencionado, Alex quis me convencer de que a mesma graça divina would be cast upon me.

Antes fosse.

Os homens são muito mais simples. Não têm essa de ficar ponderando quem querem comer. Se têm um mínimo de interesse em quem quer que seja, fazem alguma coisa. Freqüentemente, bastante idiota; dizem, por exemplo, "ei, eu sou amigo do Toninho Horta!". Mas fazem. Alguma coisa. Deixam entrever suas intenções muito claramente.

Ou seja: os homens que tinham alguma intenção de me comer, já fizeram o que puderam. Não há de ser agora que vai cair do céu um velho conhecido a me dizer - ei, sou amigo do Toninho Horta e sempre te achei interessante, mas nunca tentei nada antes porque sou tímido. Não - este cara disse que me achava interessante no momento mesmo em que decidiu que eu era interessante.

Tímidos conhecidos sequiosos por sua grande chance, portanto, estão descartados de minhas possibilidades atuais. Que mais me resta?

Sempre se pode "cair na balada" para "sair à caça" e "pegar um homem" para "fazer uma putaria".

Acontece que tudo isso me soa tão sexy e excitante quanto ficar em casa assistindo a um programa sobre a vida das cigarras no Animal Planet. Nunca fiquei com pessoa alguma "na balada". Nunca sequer olhei para alguém que eu desconhecesse, ou de cuja vida e interesses eu não soubesse nem que fosse um pouquinho. Devo ser muito mulherzinha mesmo.

Sobraram, como sempre, os amigos dos amigos que ainda estou por conhecer.

O problema é que ando sem disponbilidade alguma para conhecer pessoas novas. E não estou me referindo apenas a este momento pós-término-de-namoro (porque isso seria óbvio), mas ao momento mais amplo que abrange minha partida a um outro país e meu desejo de aproveitar ao máximo a companhia das pessoas que já conheço. Não sobra espaço para ninguém diferente - nem agora, nem quando eu já estiver minimamente recuperada do mal-de-amor.

Esqueci uma categoria de potenciais bachelors. Sempre há os músicos, que se encantam comigo porque sei diferenciar uma tuba de um trombone e um acorde maior de um menor.

Mas faz muito tempo que longuíssimas sessões frente às minhas caixinhas M-Audio substituíram minha gana por ouvir música ao vivo (aqui em São Paulo, bem-entendido).

Isso tudo, como já disse, em São Paulo. Agora, quando penso em NOLA...

Ok, até rola uns músicos por lá - mas, caramba, eles são americanos!

Americanos - que só abraçam com a parte superior do tronco e não agarram a sua coxa por medo de serem processados por assédio sexual.

Ou então agarram a sua coxa imediata e toscamente por deduzir que você é brasileira, logo puta.

É isso. Este post não propõe nem espera soluções. É apenas um arroubo de mau-humor mesmo. Há de passar.


* E, ainda por cima, sexista e generalizante - não digam que não avisei.

Marcadores:

Postar um comentário

sábado, 12 de abril de 2008

Inibições e deslocamentos

Primeiro o grande amor da minha vida me rejeitou.

Depois, o amigo a que sempre recorro nessas horas desta vez veio com uma história de que está namorando.

Agora, a room-mate do Alex vetou minha candidatura ao quarto vago da casa com incrível veemência.

O bom de o grande amor da sua vida te rejeitar é que nada mais te atinge. A coisa do amigo e da room-mate não me abalaram por mais do que dois minutos cada. Criancinhas passando fome na África, então? Bah - elas não sabem nada da vida, não sabem o que é sofrer.

O ruim de o grande amor da sua vida te rejeitar é que nada mais te atinge. Na verdade, nunca me importei muito com as criancinhas da África - meu intelecto não é desenvolvido a ponto de eu me deixar afetar por aquilo que não entra pelos sentidos - mas sempre me perturbei enormemente com as crianças e adultos habitantes das ruas aqui de São Paulo mesmo.

Esta semana perturbei-me com minha falta de perturbação. Contornei um mendigo numa praça como quem contorna um saco de lixo.

Eu não gosto de achar que as pessoas são contêineres de lixo incapazes de sofrimento.

Eu não gosto de sentir uma raiva desproporcional de meus jovens e imaturos coleguinhas do curso de espanhol.

Eu não gosto de sentir tanto ódio e indiferença por tanta gente tão sem relação com a minha vida - e não sentir ódio algum por aquele que disparou esse ódio todo em mim.

Sentir, pelo contrário, um amor que podia muito bem durar muito tempo.

Não vejo a hora de poder depositar toda a minha raiva em quem lhe é de direito. Para depois esquecer.

Impossível esquecer o que não se viveu.

Marcadores:

Postar um comentário

Fotos NOLA: segunda parte

Esse aí é o COSEAS de Tulane: aquele lugar com bandejão e livros à venda. A livraria possui um atrativo fantástico: o segundo andar é dividido por cursos. Isso, cursos: você procura o curso em que está matriculado e tem lá a maior parte dos livros da bibliografia recomendada. Evoco mestre Itamar: pourquoi je n'ai pas pensé a ça avant? Deve ser porque eu estava muito ocupada tirando xerox nesses quase dez anos de faculdades e pós-faculdades. Não que eu também não comprasse (mais) livros (do que conseguia ler) e não que eles não tenham um xerox (num outro bairro, mas têm) - o interessante é reparar na oposição simétrica que aí vigora. Enquanto em meus instituto e faculdade o xerox é que saía quentinho das máquinas depois das aulas - e, se você quisesse livros, que se virasse com o livreiro por conta própria - em Tulane é exatamente o contrário. A tia do xerox é uma figura que não existe institucionalmente.

No bandejão, tem um árabe legal, um mexicano honesto e uma padaria com uns cookies que me exigirão um investimento de pelo menos quinze minutos diários só para eles - que, aliás, já fizeram o grande favor de me tirar todo e qualquer gosto por chocookie. E pensar que houve época em que eu comia um pacote por dia. E era quase dez quilos mais magra. Eu era infeliz e não sabia.

Não resisti a publicar outra foto de predinho.




Pensando bem, que Hogwarts o quê... O Newcomb Hall é muito mais charmoso. E tem o gramado - foi fácil me visualizar deitada ali, munida de uma canga, um livro, um iPod e um cookie.



Dois metros pra trás, o portão, aberto 24h. Fiz o mestrado no Brasil sobre um autor estado-unidense e vou fazer o doutorado nos Estados Unidos sobre um autor brasileiro (na verdade, um-uns-uma-umas, autor-autores-autora etc., you get the picture); estudei numa universidade pública que fecha os portões todos os dias e vou estudar numa universidade particular que traz os portões sempre abertos. Coisas que terei dificuldade de explicar aos marcianos quando eles vierem me fazer uma visitinha.


Finalmente, ele!!! O Idelber é massa, o Idelber é o cara, o Idelber tem o blog - mas, por favor, não deixem de reparar no meu casaquinho novo de cashmere.

(Mais sobre ele mais tarde.)

Marcadores:

Postar um comentário

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Fotos NOLA: primeira parte

Sidney (nem esta nem aquela, e sim este genial e pouco ouvido cara) + eu na foto inaugural da série de New Orleans. Se eu fosse ditadora do mundo, todos os aeroportos teriam nome de músico, trariam exposições fotográficas como essa e, imposição ditatorial número 1, estariam proibidos de tocar versões pauterizadas de Jobim em suas dependências. Vejam que o aeroporto de NOLA não precisaria sofrer nenhuma adaptação às minhas generosas ordens!

Então peguei o carrinho alugado e saí do aeroporto. Quando ligo o rádio, que é que me espera? "Amor não tem que se acabar..." (Escrever isso hoje é até um pouco irônico, mas pensem no contexto daquele dia) - especial de aniversário da Elis na melhor rádio que já ouvi. E o melhor: excetuando-se esse programa de música brasileira, não ouvi mais nada que eu conhecesse. E adorei tudo. Alegria de descobrir um universo estranho pela frente - a angústia da ignorância decididamente não me acomete quando se trata de música.


A obrigatória foto do Rio Mississipi. Aos que forem me visitar, um aviso: rio não é praia - ele faz curvas, e portanto não dá para se localizar na cidade com base apenas no famigerado "lado do rio". Sim, e dois mais dois são quatro e Pedro Álvares de Cabral descobriu o Brasil - vão rindo.



Alex Castro com cara de romancista a matutar sobre os destinos e desvarios de suas últimas criações literárias. Ao final do primeiro dia que passei com ele, eu já o conhecia há anos; depois de uma semana, éramos um casal de velhinhos cheios de manias morando juntos há meses.



Arvrinhas de monte, característica que está entre as top 3 coisas mais legais da cidade.



Me achando grande coisa em meu dodginho vermelho - nele, eu não usava espelho etc.



Pequena e aleatória amostra de casinhas fofas new-orleanianas.



Mercado e farmácia nos EUA são experiências de abundância, lugares onde você descobre desejos e necessidades prementes que até então não sabia que tinha. Dos mercados, o Whole Foods - vai um cogumelinho aí? - é o mais impressionante, emocionante e perigoso: minha idéia inicial era comprar pão, cottage e presunto para o café da manhã. A concretização final da idéia deu no seguinte: creme de chocolate com hazelnut (nutella taken to the next level, basicamente), nachos, chutney pra comer com os nachos (não é que deu certo?), iogurte com limão (cheguei a sonhar com ele uma noite, acordei feliz da vida sabendo que ele estava quietinho na geladeira a me esperar), um Chardonnay californiano (prontamente entornado numa noite caseira em que não passei dos dez minutos iniciais de filme), uma sopa de milho de caxinha (que o Alex ainda precisa me contar como é não deu tempo de experimentar), um sabonete de camomila e presentinhos para o Rafa (já prontamente encaminhados para pessoas mais merecedoras). Além, é claro, de pão-trocentos-grãos, cottage e presunto (com mel). Por que será que bateu uma repentina vontade de café da manhã?



Primeira foto do campus de Tulane! Adoro as árvores com raízes no céu.




Sempre considerei Hogwarts o personagem mais interessante dos filmes do Harry Potter. E sempre acreditei que eu seria uma aluna muito mais motivada estudando lá (prédio de aulas bonito, caderno novo, lápis tinindo, borracha branquinha - tudo isso contribui deveras para o bom exercício da atividade intelectual). Pois agora cheguei bem perto de virar uma personagem infantil de sucesso: dêem só uma olhada nos prédios que compõem Tulane, lindos - e, se bobear, rola até um fantasminha à noite.



Esta entrou pra galeria só porque saí bonitona.


Esta também. (A vaidade adquire outro significado em tempos de tristeza.)

Marcadores:

Postar um comentário

Pequeno esclarecimento

Escrevi o texto do post abaixo porque vi o seguinte adesivo na traseira de um carro hoje de manhã:

2008 - EU VIVO O ANO FELIZ E RECALCADO

Minhas primeiras tentativas de soterrar o espanto envolveram a consideração de que tais dizeres podiam estar fazendo referência a um hino evangélico ou ao mais novo sucesso do rock nacional. Como o google não acusou nada, passei a uma nova tentativa de cuidar do meu espanto: escrever uma história que desse algum sentido ao adesivo.

Vocês por favor me digam se consegui.

Marcadores:

Postar um comentário

Gabriela e o recalque

A organização tem seus problemas. Trinta e um de dezembro, seis horas da tarde e Gabriela viu-se sem ter o que fazer. A parte que lhe coubera na preparação da ceia de fim de ano fora das mais simples: lavar e levar a salada. Nada diz café-com-leite tanto quanto uma salada. Aos vinte e três anos, era o que ela havia voltado a ser. Neste Ano Novo, nem peru e nem champanhe: café com salada. E leite. O café escorrendo pelas dobras do alface, o leite infiltrando-se na polpa do tomate. Gabriela sentiu nojo. Sentia nojo de quatro a oito vezes por dia. Nunca de algo que lhe entrasse por algum dos sentidos - nada de fora podia abalá-la. Nojo de pensamentos.

Só de sua mãe podia sentir nojo e outras duas ou três coisas que tinha preguiça de nomear. Trinta e um de dezembro, seis horas da tarde, tarefa antecipadamente cumprida: Gabriela rumou para a casa da mãe, munida de uma salada e um vazio. "Filha, que bom que você chegou cedo, vamos conversar. Senta." Gabriela sabia que não queria conversar e sabia que chegara mais cedo para sentir o fastio de quem é obrigado a conversar não querendo conversar.

"Filha, como você está?"

Há uma semana a filha dispensara Astolfo, namorado de quatro anos e oito meses. Era solidariamente chamado de Tó pelo resto do mundo, mas Gabriela não era o mundo: era mulher de Astolfo.

"Filha, o que deu em você?"

Tó-Astolfo queria casar.

"Filha, não tinha mais química?"

Gabriela sente um princípio de pontada de nojo que não chega a incomodar.

"Ele não se preocupava com o seu prazer sexual?"

Tó-Astolfo não se preocupava com muita coisa.

"Ele queria loucuras na cama?"

Gabriela levanta uma perna e uma nádega intentando mudar de posição, mas desiste e deixa que repousem no mesmo lugar.

"É isso, ele queria loucuras na cama."

Gabriela sabe onde a mãe está para chegar.

"E você é uma recalcada."

Se a culpa não era de ninguém, a culpa só podia ser dela: uma recalcada. Para todos poderem respirar aliviados.

"Mãe, eu que não quis saber dele."

"Porque você é uma recalcada."

Gabriela sabia que sentia nojo e agora estava aprendendo a sentir-se recalcada: recalque era não querer Tó-Astolfo na cama, louco ou são.

Achou este sentimento menos difícil do que o nojo e no dia seguinte mandou fazer um adesivo para o carro:

2008 - Eu Vivo o Ano Feliz e Recalcada

E assim viveu.

Postar um comentário

terça-feira, 8 de abril de 2008

Meus problemas com o atual Pat Metheny Trio

Chegou o momento de meu "opinionado" texto sobre o atual PM Trio - que ouvi pela sexta vez há exatos vinte dias - vir à luz.

Claro que gostei. É o Pat, pô - ele vai ter que se esforçar muito para voltar a gravar alguma coisa que eu claramente desaprove.

Mas gostar de um show do Pat, para mim, é muito esquisito. Gostar, eu gosto de sucrilhos, de Friends, de desfiles de moda. Tudo muito bom, muito bonito e bem feito - mas nada que provoque uma profunda imersão de meu corpo em outro universo. Sabe, eu sou eu e o sucrilhos é o sucrilhos - bacana, mas nossa relação parou ali. Com os discos e shows do Pat, nunca foi assim: estou acostumada a sentir meu corpo inteiro se transformando em música.

Não desta vez - e, a bem da verdade, também não da outra vez que vi este trio, em 2003. Só que, cinco anos atrás, tratava-se de uma banda ainda em processo de formação: o repertório ainda não estava bem definido, o Pat ainda estava aprendendo a compor para Christian e Antonio - e, principalmente, o Pat ainda estava lutando para aprender a tocar as músicas que ele próprio compunha. Existe um fascínio intrínseco à gestação e ao parto: minha emoção, naqueles dias, tinha mais a ver com isso do que com um prazer musical propriamente.

Hoje, a banda está grande, com RG, CPF e carteira de vacinação. Está redondinha; está no auge.

Ela cresceu - e fez um show-sucrilhos.

O que é bastante curioso, considerando-se que, no papel, esta banda teria tudo para me emocionar mais do que muitas outras bandas em que o Pat já tocou.

Este texto procura descrever o porquê de o sucrilhos ter prevalecido.

***

Quero primeiro dizer de onde parto: da convicção de que Christian e Antonio estão entre os melhores músicos de todas as bandas regulares do Pat. Certamente, muito melhores que Larry Grenadier e Bill Stewart.

No que ouço vozes se levantando e sinto um calor de tochas se erguendo, num clamor indignado: como assim, melhores? Melhores em que, por que, pra quem?

Sinceramente, não entendo por que as pessoas têm tantos pudores em usar termos comparativos (quantitativos, então, nem se fale) quando se trata de música. A esse pudor, costumo responder com o seguinte: se não posso afirmar que o baterista A é melhor que o baterista B, então você também não pode dizer que o Keith Jarrett é melhor pianista do que eu. Somos todos iguais - todos politicamente corretos - e todos, efetivamente, falsos. Hipocritamente falsos.

Melhor, para mim, significa o seguinte: que o músico dispõe de mais recursos. Rítmicos, harmônicos e melódicos; técnicos, dinâmicos e timbrísticos (os aspectos "físicos" - fluidez, volume e textura - do som contam demais aqui para estes ouvidos).

Conheço bem pouco dessas coisas todas. O pouco que conheço às vezes me permite apontar em quais aspectos determinado músico é especialmente hábil; freqüentemente, nem isso. No caso dos baixistas e bateristas do PM Trio, algumas qualidades objetivas parecem-me patentes. Ritmicamente, por exemplo, Chrsitian e Antonio transitam por áreas de cuja existência os demais músicos deste planeta nem desconfiam; além disso, o Antonio é dotado de um senso dinâmico que o permite tocar bossa nova e rock pesado com igual autoridade.

Muitos outros comentários desse tipo - e, aliás, mais bem desenvolvidos - poderiam ser traçados sobre cada um dos músicos do trio (não por mim, é claro; algum músico bem-articulado teria de fazê-lo). O mesmo se poderia fazer com a música em si, naturalmente - análises não só das composições como também de sua transposição para o mundo do ao vivo.

Não é isso, porém, o que me move e interessa especialmente - pelo menos, não neste texto.

Interessam-me a mágica e o mistério: a maluca realidade de que as habilidades do músico (espero que eu me tenha feito entender quanto a isso: por habilidade, não estou me referindo àquela de tocar Brasileirinho a duzentos por hora, de trás pra frente e com um pé amarrado nas costas) não garantem nada.

Não garantem a produção de uma música que, naquele espaço intermediário entre o objetivo e o subjetivo, possa me arrebatar.

É precisamente neste ponto que falar em melhor ou pior - aí sim, concordo com a opinião geral - perde completamente o sentido.

Porque talvez, objetivamente, a música deste Pat Metheny Trio seja superior à produzida por meu trio favorito, com Larry e Bill. Consigo até visualizar uma tese de doutorado que defenda este argumento*.

Mas, se considerarmos a área intermediária da experiência - aquela onde se dá a recepção da obra - o PM trio anterior faz alguma coisa que este atual não faz.

Aliás, a "coisa" talvez seja só isso: Pat Metheny, Larry Grenadier e Bill Stewart tocando Question & Answer - ou quase qualquer outra que eles tocavam - criam esta área intermediária da experiência em mim.

O trio atual, com todos os recursos de que dispõe, não.

***

O que se passa, então, que o trio atual não me diz quase nada, ou muito pouco?

Lembro-me da folclórica história do empreendimento que faliu por excesso de sucesso. Aconteceu mais ou menos assim: era uma vez uma loja no shopping que fazia tanto sucesso, que as pessoas faziam fila do lado de fora para poder entrar. Acontece que o contrato do aluguel previa o pagamento de toda e qualquer área utilizada pela loja em questão. Ou seja: quanto maior o sucesso, maior a fila; quanto maior a fila; maior o valor do aluguel. Resultado: a loja faliu.

A história pode até ter sido inventada, mas a metáfora é ótima. Para mim, o atual PM trio peca por excesso de criatividade. É muita coisa acontecendo, simultaneamente, o tempo todo.

A começar pelas composições. O Pat definitivamente não nasceu para escrever composições complicadas. Não dá - não gosto. Principalmente quando aquelas melodias extremamente up-tempo são dobradas com o baixo - e, on top of all that, pela bateria também. É muita informação, por demais condensada e compactada. Tipo a reportagem da Veja que se propõe a dar conta do problema do mal em suas dimensões filosófica, política, religiosa e psicológica. Obviamente, a Veja não faz nada disso, coitada - mas suponhamos, a título de comparação, que fizesse. Imaginemos uma reportagem que em oito páginas efetivamente resolvesse o problema (filosófico, religioso etc.) do mal. Pois é isso o que faz esta banda: em oito minutos, dá conta de tudo o que um trio de jazz pode fazer. Nada demais nisso - só que eu, sinceramente, prefiro me dedicar aos grandes problemas filosóficos da humanidade ao longo de oito volumes. E aos grandes atrativos da música em pelo menos 80 minutos.

Nesse trio, falta espaço. O show foi me causando uma progressiva sensação de sufocamento e um lânguido desejo de silêncio - desejo este que foi contemplado, paradoxalmente, nos solos de baixo e bateria. Por quê? Porque o Pat é o mestre dos espaços. Assim, quando o Christian solava, o Pat encaixava a notinha e o acorde perfeitos - aqui e ali, uma vez ou outra por chorus, nos momentos ideais. Sons que só faziam sublinhar o que o Christian estava criando. Um bom exemplo disso esteve num blues reminisciente de Soul Cowboy, que teve um solo de baixo extremamente bem construído, começando por um walking bass pra lá de tradicional que aos poucos foi se libertando de suas amarras rítmicas e se imiscuindo por melodias cada vez mais interessantes.

Fico imaginando como este mesmo solo teria soado se, em vez das notinhas esparsas, o Pat tivesse tocado quatro acordes por compasso.

Era mais ou menos isso o que acontecia toda vez que o Pat solava. Baixo e bateria praticamente solavam junto. E aí ficava difícil prestar atenção no Pat. Sorry, mas meu cérebro precisa de espaço para pensar, para processar. Coisa que Christian e Antonio não me proporcionavam de jeito nenhum.

O melhor exemplo disso esteve em The Bat, balada antiga recentemente regravada no Trio Live. Na versão de vinte dias atrás, meu desejo sincero era de colocar o rosto do Antonio entre as duas mãos e dizer: "Guapo, escolha UM prato dentre os cinqüenta que você tem e mantenha-se nele até o final, por favor!". Que saudade do Paul Motian - que saudade de uma condução simplesinha, sem outros cinqüenta pratos acontecendo ao mesmo tempo.

(Vejam bem: quando os cinqüenta pratos aconteciam nos solos do Antonio, era lindo - porque era só ele, ele e a música. A grande graça desses solos, para mim, é ficar sacando a relação do que ele está fazendo com a composição original. E ele sempre acrescenta à minha percepção da música - sempre. Já estou com saudade de ouvir esses solos se formando em tempo real.)

Em When We Were Free, a Question & Answer da vez (exatamente o mesmo arranjo, só muda a música), o mesmo problema: faltou groove - alguma bóinha que eu pudesse agarrar em meio à tempestade no oceano. (Se bem que sou obrigada a admitir: bem no finzinho dela, a geléia geral fez todo o sentido para mim. Raríssimo momento.)

Acabou que as únicas três coisas que adorei mesmo, com todo o meu corpo, foram as seguintes...

Os violões do começo do show. Eu não sei como é que eles conseguem fabricar aquele timbre. Das músicas em si, nem lembro: o som é tão inebriante que as deixa em segundo plano.

A balada para New Orleans - violão lindinho e finalmente um steady beat no terceiro tempo.

E, disparado o melhor momento musical da viagem inteira - Lone Jack. O Antonio nasceu para tocar essa música - um samba que não é bem samba, mas que também não é bem jazz. E o Christian tocando bem suingado e bem normalzinho foi fantástico. Ninguém atropelou ninguém e todos saíram vivos e felizes no final.

Principalmente eu, que finalmente pude viver um fenômeno transicional...

*Merleau-Ponty à parte, é possível analisar um objeto à distância - desde que se saiba que esta distância parte de um ponto determinado. Coloquei o Merlô na roda só para que saibam que não tenho uma visão muito ingênua da objetividade; sei da impossibilidade do sobrevôo, da impossibilidade de fugir do próprio ponto de vista. Mas sei também da riqueza intrínseca a esse exercício de distanciamento do objeto.

Marcadores:

Postar um comentário

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Sabem qual é o desespero?

... É que este último post não era para ter sido um post.

Era para ter sido um entre mil outros assuntozinhos a serem conversados com o Rafa no momento como-foi-o-seu-dia.

Pronto, chega.

Um pouquinho mais de paciência, gente. Só mais um pouquinho.

Marcadores:

Postar um comentário

Cantantes en español, por favor!

Não faço a menor idéia se o título deste post faz algum sentido, mas não tem problema: ultimamente tenho me achado no direito de tudo - pessoas apaixonadas e pessoas em luto deveriam ter vaga especial em estacionamento - principalmente no de cometer os mais ridículos erros agora que estou me propondo a aprender espanhol com toda a seriedade.

Meia hora de aula e repassei internamente algumas dezenas de músicas que formaram meu caráter: Violeta Parra, Pedro Aznar, Claudia Acuña...

Naturalmente, Ivan (Te Recuerdo, Amanda), Elis, Milton.

Aí o professor informa que o som de V simplesmente não existe em espanhol. (A língua com que todo fanho sempre sonhou, portanto.)

E eu, que nasci e cresci banhada em Clube da Esquina, estranhei pacas. Poxa, e o monte del olvido, como é que fica?*

Então vim ouvindo a música na volta para casa, fazendo aquele estranhíssimo exercício de prestar atenção na letra.

Foi quando me veio o que Freud talvez chamaria de "lembrança encobridora": para mim, criança, Dos Cruces era a música em que o Milton cantava a tristeza de ter dor de ouvido.

Mas tudo isso foi só para preparar o terreno da seguinte questão: que mais que eu ouço para treinar o (agora sim) ouvido? Obras completas de Ricky Martin?

Alguém tem alguma outra sugestão? Porque me deu um branco (blanco) completo aqui (ahí?). Lembrem que continuo estranha (extraña! será que é usada com esse sentido?) e burrinha (bestilla?).

* Da canção Dos Cruces, uma das realizações mais altas da espécie humana.

Postar um comentário

domingo, 6 de abril de 2008

Fotos NY: Despedida (21/03)

Saí gata nessa.



Nessa também.



Minutos antes de entrarmos no gelo.



Outra que vai direto pro porta-retrato.



No Wollman Rink (não, ela não é nossa amiga).


De novo aquela avenidona querida, agora iluminada pelo sol e pela Bel. O pacotinho de nuts não me deixa mentir: um lanche só no Burger Joint é muito pouco.



Vista do Belvedere Castle.



De novo aquela carinha da Bel que lu e eu adoramos.



No restaurante das zebrinhas. Pedi um macarrão com frutos do mar - como é que eu podia ir embora sem ter comido uma lulinha sequer? Mal sabia eu dos camarões que me aguardavam em Nola.



Uma das fotos mais bonitas que já tirei.


The Botters acharam esta foto meio demoníaca, como que saída de um filme de horror (talvez pela luz vermelha). Alguém concorda? Ela foi tirada antes do último show, o mais lindo da viagem toda, que me borrou a cara inteira de rímel.

Marcadores:

Postar um comentário

Fotos NY: Parque-compras-música, pra variar (20/03)

Véinha descansando enquanto as amigas atletas estavam prontas para ir a pé ao Bronx e depois descer até a Estátua da Liberdade - tudo isso em quarenta minutos. Atenção para a bolsa nova que veio a público neste dia.



A preguiça de levantar rendeu esta foto.



Bel radicalizando e Lu com cara de é-isso-mesmo-que-você-quer-pra-sua-vida?



Bilhetinho da Lulu para evitar uma síncope nervosa na véinha.

Marcadores:

Postar um comentário

Fotos NY: Aniversário Bel & Lu (19/03)

No Del Posto, rapidamente alçado ao posto de restaurante italiano favorito.




The Botters.



No aniversário delas, ganhei um pincel de brush da MAC! (Gostei tanto que dei um igualzinho pra minha tia.)



Bobeira no banheiro.



Este prato merecerá um post à parte.



Já prevendo o que estava por vir.



Adoro essa carinha que a Bel faz! Parabéns de novo, meninas!

Marcadores: