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domingo, 23 de dezembro de 2007

Boas coisas!

A partir de hoje, este blog entra em férias. Embarco para o sítio da Greyce levando na mala alguns livros, muitos discos, nenhuma maquilagem e, principalmente, nenhuma roupa branca. Aos que ficam e aos que vão para outros lugares, lembrem-se de que all you need is love, seja em inglês ou camaronês. Boas coisas a todos, e até o dia 02!

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sábado, 22 de dezembro de 2007

Natais, passado e presente

Hoje em dia por pouco não soa brega dizer que se gosta do Natal. Talvez as pessoas já admitissem seu horror a Papai Noel há muito tempo, e só não o comentavam perto de mim por respeito à minha infância ou juventude - fato é que as pessoas ao meu redor vêm confessando seu desânimo natalino com freqüência e incisividade cada vez maior nos últimos anos.

É impossível mesmo não se desanimar com o excesso de melodias saltitantes (tirando "chestnuts roasting on an open fire" e as mórbidas canções natalinas da Joni, quase nenhuma se salva - exceção feita, naturalmente, ao disco de Natal do James Taylor, único artista, aliás, que poderia gravar um disco inteiro contendo apenas diferentes versões de Happy Birthday to You e ainda assim ganhar fácil o título de disco do ano deste blog), o excesso de bondade - tanta, que se você não fizer algo de excepcionalmente bom e caridoso nesta época, você só pode ser mesmo um grandessíssimo filho-da-puta, seu desgraçado; o excesso de presentes - incluindo aqueles que passarão diretamente às mãos do pobre mais próximo, seja o porteiro ou a empregada; o excesso de canções natalinas, mas sobre isso já falei antes. Para não falar no trânsito e no saldão das Casas Bahia - mas sobre isso, ufa, também já falei em outro post.

A despeito dessas intempéries, continuo acreditando na mágica do Natal. E a mágica está em que, na noite do dia 24, quando finalmente chego na casa da minha avó e lá encontro minha pequena e aconchegante família, todas as filas de crediário, toda a fúria de caridade, todo o especial do Roberto Carlos - tudo isso, seja por obra de Jesus Cristo ou Isaac Newton, desaparece completamente. Pois esta é a maior mágica do Natal: fazer sumir todo o inferno que o antecede.

***

Tenho uma folha corrida de excelentes Natais passados com minha família. Até mesmo aquele momento que supostamente deveria ser dos mais tristes na vida de uma criança - a dura constatação de que Papai Noel não existe - foi para mim um momento da mais pura felicidade. Aconteceu assim: o Papai Noel contratado para dar o ar de sua graça na casa de minha avó no Natal de 1987, quando eu contava com cinco anos e nove meses de vida no currículo, calhou de estar bêbado, e seu gorro calhou de estar frouxamente preso na cabeça, deixando visível uma pequena faixa preta em sua nuca. Ou seja, o ar da graça do Papai Noel aquele ano cheirava a álcool, não me restando outra opção a não ser acreditar que bebidas alcoólicas possuíam o curioso efeito de tingir instantaneamente cabelos brancos em pretos. A menos que - a menos que o Papai Noel em questão fosse um homem qualquer fantasiado de Papai Noel, e o cheiro de álcool e o cabelinho preto na nuca fossem dois fatos isolados sem qualquer conexão. Eu estava muito confusa: tudo parecia altamente improvável. Eu sabia que não conseguiria desvendar esse mistério sem a ajuda da minha mãe.

E minha mãe, com todo o talento de que dispunha para lidar com a Camila criança, saiu-se com a melhor solução possível: basicamente, uma solução que não afrontava minha inteligência nem minha dignidade. Em primeiro lugar, ela valorizou meu espírito científico em considerar que as duas possíveis causas explicativas para o fenômeno do Papai Noel bêbado-de-cabelos-pretos mereciam igual e cuidadosa consideração. Em segundo lugar, explicou que se de fato houvesse uma substância que, ao ser ingerida, escurecesse os cabelos brancos, tal substância não deveria restringir seus efeitos aos pêlos de uma região específica do corpo como a cabeça, e sim espalhar-se pelo corpo todo. Portanto, não havia justificativa possível para a coexistência dos cabelos pretos com a barba indiscutivelmente branca do Papai Noel. Assim, ficava a primeira hipótese descartada.

Em terceiro lugar, portanto, eu havia chegado sozinha ao desnudamento de um dos maiores embustes impostos às crianças: a existência do Papai Noel! Explicou-me ela que Papai Noel não passava de uma invenção dos adultos para melhor controlar as crianças e garantir que fossem boazinhas, senão o ano inteiro, pelo menos de novembro em diante. Mas eu, que quase não era mais criança, não precisava disso, pois sabia que era necessário agir de forma correta e boazinha o ano todo, simplesmente porque ser correta e boazinha é bom, com ou sem Papai Noel.

Assim, com uma satisfação que beirava a mania, entrei para o clube emérito das crianças que descobrem sozinhas o embuste da existência de Papai Noel. A mania só não chegou a se realizar por completo porque me lembro de ter ficado um bocado intrigada com o ex-Papai Noel - agora homem comum - bêbado: afinal, mamãe, além de ter o cabelo preto, esse Papai Noel parece assim um pouco bobo, não entende direito o que a gente fala. É por que ele está bêbado? Ou não tem nada a ver, que nem o cabelo?

Mas isso minha mãe, filha de alcoólatra, não quis - ou não pôde - responder.

***

Se o Natal em que entrei para o clube que depois vim a descobrir não ser nada emérito transcorreu sem maiores intercorrências, vocês podem imaginar que os Natais seguintes foram ainda melhores. Como única criança da família, até que consegui atravessar o desmame dos presentes sem grandes traumas, mais uma vez por obra de minha talentosa família: aos poucos, as dezenas de presentes foram sendo substituídas por um ou dois pacotes, mas - vejam bem - um ou dois pacotes de presentes realmente significativos, tipo um vale falso da Livraria Cultura. O vale falso possui sobre o verdadeiro a enorme vantagem de não ter limite de crédito: "filhinha, vai lá e compra quantos livros quiser, o suficiente para você passar as férias". Até hoje tenho livros não-lidos de Natais passados. E assim minha angústia da ignorância vem aumentando, bem como o prazer em passar as férias lendo um pouquinho do que não li o ano inteiro.

***

Depois de um tempo, meus Natais ganharam um colorido sexual bastante significativo. Tipo isso aqui:


(foto cortesia de http://mistressmatisse.blogspot.com)

E mais não digo.

***

Este ano? Comecemos pelas não-realizações: tenho o maior orgulho em poder dizer que este é o primeiro Natal em que não fiz compras no Shopping Center Norte - nem em nenhum outro shopping, por sinal. A experiência foi tão positiva que pretendo repeti-la pelo resto de meus Natais.

De resto, será um Natal atipicamente assexuado - mas até aí, o do ano passado também foi, e sobrevivi - e tipicamente repleto de arroz, farofa, feijão com lingüiça, costelinha e creme de milho. Será um Natal restrito, com minha avó e minhas tias apenas.

Será um Natal, como sempre, feliz.

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sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Momento Grey's Anatomy, ou Barrados no Baile do Hospital

Overheard no HC hoje:

Funcionária #1: - Puxa, a paciente trouxe presente pra todo mundo, menos pro principal, o Dr. Fulano.

Funcionária #2: - É que ela não sabe que o Dr. Fulano é médico dela.

Funcionária #3: - Ela decidiu que o médico dela é o Dr. Beltrano, o bonitão, e pronto.

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terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Alta!

Papai já está salvo (são, é uma outra história...) em casa, conforme estava previsto. Agora é torcer para que esta internação tenha incutido um mínimo de juízo em sua cabeça dura, para que ele compareça a consultas regulares (e vamos combinar que regular não é uma vez no semestre) com cardiologista, endocrinologista e nutricionista - e, principalmente, para que siga as condutas médicas rigorosamente. E, mais principalmente ainda, que ele possa fazer cinco coisas ao mesmo tempo, em vez de dez. E também o principal, que é descansar pelo menos um dia na semana - toda semana, não uma vez por mês. Sem esquecer, naturalmente, do principal, que é manter ou aumentar a freqüência nas aulas de natação. Tudo isso para que, no final de 2008, ele possa assinalar com orgulho e alívio na enquete das não-realizações pessoais: "não coloquei uma ponte de safena no coração".

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segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Ainda no hospital...

Papai continua internado; deve receber alta amanhã de manhã, se estiver tudo ok com o exame que fez há pouco. Enquanto isso, tenho ficado mais lá do que cá - daí a falta de atualizações deste blog. Todavia, me aguardem: nestas horinhas que tenho passado com ele, venho fazendo um curso intensivo sobre o que de mais relevante aconteceu no futebol mundial em 2007 - do Milan ao time do artista "sertanejo"*, da Marta à contratação de um apache para o timão. Haverá muito o que escrever, sem dúvida.

* Estou seguindo aqui a classificação proposta pela Pop's, a lodjinha de música do meu coração: sertanejo sem aspas é Tonico & Tinoco, com aspas é das duplas que ficaram ricas.

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sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Wishful thinking, por favor

Nunca fui de acreditar muito nesses lances cósmicos, de energias positivas e negativas, alto e baixo astral. Até o dia da defesa do meu mestrado, quando senti na pele e passei a acreditar com mais firmeza na existência de algo como energias boas canalizadas para uma pessoa.

E, se restava qualquer dúvida, ela foi suprimida pela fé, pois apenas uma vez na vida precisei tanto de algum wishful thinking como agora: meu pai foi internado na UTI ontem à noite, sob suspeita de infarto. A médica acha que não deve ser nada, mas não foi boba de deixá-lo ir para casa, o que achei ótimo. A visita com boletim médico é daqui a pouco.

Então, por favor: wishful thinking, wishful calls, wishful commentaries - tudo para termos de volta o quanto antes neste blog aqueles comentários tipo "um beijo, filhota!" e "adoro você, sua linda!", que constituem a milionésima parte de tudo o que de bom meu pai trouxe e traz para a minha vida, sempre.

~~~

EDITADO PARA ACRESCENTAR: Ha! Mal deu tempo de fazermos pensamento positivo, e puf - uma hora, um cateterismo e muitas unhas roídas depois, veio a notícia de que não era nada. Ou melhor, é claro que era, uma dor é sempre alguma coisa - mas definitivamente esta dor não foi causada por nenhum problema cardíaco. Ufa. Agora é passar alguns dias de molho, todos os dias se cuidando bastante, e pronto.

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quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Festinha Freud & Ana

É claro que este blog não poderia se furtar a pelo menos um post sobre a única coisa realmente não-deprimente - e, pelo contrário, bastante agradável - suscitada pelo final do ano: os encontros e reencontros, celebrações e festas motivadas pelo simples prazer de conviver por algumas horas com pessoas interessantes. E tudo isso fica melhor ainda quando na dita celebração não existe um chefe a quem agradar ou um pretendente a quem impressionar. Foi o caso de ontem à noite, quando pude compartilhar com antigos e (futuros?) colegas algumas dezenas de sushis, sashimis e tempurás (Batata, diz aí: quando a gente fala "dois tempurás", está se referindo a duas porções de tempurá ou a dois vegetaizinhos de tempurá?). Além, é claro, daquelas outras coisas que psicólogo adora, tais como retrospectivas de vida e crises existenciais.

Com vocês, a mestra e os integrantes de todas as épocas de um grupo de estudos de Freud sem o qual este blog certamente teria outro nome:

De pé: Marília Carolina, Batata, eu e Pedro.
Sentados: André, Dani, Gisele, Angélica, Débora, Marília e Ana, a mestra.
Nem de pé, nem sentado: Rafael.


Brinque de ligue os pontos e descubra você mesmo quem é quem com base na foto anterior.

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terça-feira, 11 de dezembro de 2007

A camiseta mais feia do mundo

Eu achei que já tivesse visto muita coisa feia neste mundo. Mas eis que uma simples noite num shopping me mostra que existem mais coisas entre o terceiro subsolo e a praça de alimentação do que se possa imaginar.

Não pensem que escrevo este pequeno texto como arauto (qual o feminino de arauto, arauta?) da moda e da beleza. Não: eu mesma só me visto bem uns 3 ou 4 dias na semana (melhorei muito, antes minhas preocupações estéticas eram apenas quinzenais). Não tenho o bom gosto nem a paciência necessários para combinar o sapato com a bolsa todos os dias. Dependendo do compromisso, saio de casa como quem vai fazer as compras do mês no Bergamini - excluindo-se desta comparação, é claro, a minha querida avó, que não desce do scarpin nem quando sai para comprar dois galões de cândida e cinco quilos de feijão.

Era esse o meu caso ontem. Vestia eu uma roupinha de briga qualquer, o pensamento vagando por assuntos nem ao menos remotamente relacionados ao mundo fashion, quando de repente...

De repente vejo uma mulher rechonchudinha, com as suas 40 primaveras de vida, vestindo uma camiseta com estampa de oncinha.

Bom - até aí, tudo médio. Não que a visão de uma senhora roliça espremida numa justíssima camiseta de oncinha seja exatamente a minha concepção de paraíso, mas vá lá.

O problema é que a camiseta não parava aí.

Bem no centro da dita cuja, na altura do peito, pairava o rosto de uma das meninas superpoderosas - a de cabelos escuros, a Docinho.

E não só isso: a imagem brilhava. Brilhava e cintilava, resplandecia em toda a sua riqueza de cores. A superpoderosa em questão (a menina, não a mulher) possui os olhos verdes e os cabelos negros, o que tornava a sua imagem na camiseta irremediavelmente semelhante a uma mosca varejeira. Uma mosca prestes a ser devorada por uma onça.

Por que, meu Deus, por que alguém teria interesse em vestir o próprio corpo com uma onça que se alimenta de varejeiras?

A humanidade jamais deixará de me fascinar.

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domingo, 9 de dezembro de 2007

Um fim de semana no Oriente Médio

Tá, o fim de semana foi passado em São Paulo mesmo, capital e interior. Mas começou com Amós Oz na manhã de sábado (será que meus três leitores + minha quarta leitora ainda agüentam meus posts sobre ele?) e prosseguiu com uma festa árabe que, ao primeiro pão com coalhada, transformou o Arábia num Habib's mais ajeitadinho. A tarde prosseguiu com uma passagem tão breve quanto excruciante pelo interior paulista - e o trânsito e o calor não foram os principais responsáveis por isso. A visita interiorana, contudo, era necessária - e sim, mostrou-se bastante recompensadora. Afinal, o Oriente Médio não consegue ir muito longe numa cabeça cristã: fui criada para esperar o prazer depois (junto?) da dor. Nem que ele tenha de ser comprado: no sábado, o prazer atendeu pelo nome de "oitava temporada de Seinfeld", adquirida junto da nona, de um livro novo (mais uma vez, dor e prazer caminham juntos: a angústia da ignorância suscitada por mais um livro na pilha é acrescida da alegria que vem com a consciência de que mais um desejo literário será eventualmente saciado) e de uma caixinha de lápis inútil e essencial.

Então no sábado à noite mergulhei no meu binge judaico, e assim fiquei pelo resto do fim de semana, transitando entre Amós Oz e Seinfeld. Sobre o primeiro (respirem fundo que aí vem mais deslumbramento), queria tentar comunicar aquela que considero a grande qualidade do livro que estou lendo - e tentar fazê-lo sem recorrer a exemplos. Será que dá?

Na Flip, Oz leu um trecho que buscava (e conseguia) retratar a pouca distância que vigora entre tragédia e comédia (coisa, aliás, também explicitamente buscada, porém não conseguida, por Woody Allen em Melinda & Melinda). Não me recordo se ele apontou este como o objetivo do romance como um todo ou só daquele trecho em particular. O que quer que ele tenha dito na ocasião, eu fico com a primeira alternativa.

E como, pergunto a ele, a mim e a vocês - como ele consegue fazer isso? Eis o que venho notando ao longo da leitura até agora: Oz apaga muito sutilmente as fronteiras entre tragicidade e comicidade (é sutil porque não é tragicômico, principal problema do filme de Allen) à medida que retrata os personagens e situações da maneira mais absolutamente crua, objetiva e perscrutadora, beirando um cinismo que nunca chega a se realizar porque tudo isso é perpassado pela mais profunda compaixão. O resultado é um humor compassivo - enquanto humor, muito diferente daquele a que estamos habituados, pois nada tem a ver com a ironia ou a sátira: em nenhum momento o narrador "tira sarro" de um personagem, por mais que o leitor o considerasse digno de tal. Por outro lado, a compaixão nada tem a ver com o "perdoa-os, Pai, pois não sabem o que fazem" cristão, mas com um exercício tenaz de empatia, de aproximação da alteridade.

E como, pergunto mais uma vez, como ele faz isso? Como diria vovô Aleksander (essa é só para quem leu o livro): esta é uma questão em que ainda estou a trabalhar.

***

Com relação ao segundo elemento do meu binge judaico, veio-me a vontade de compartilhar um depoimento de Jerry Seinfeld, o próprio: disse ele que o seriado constituiu sua grande oportunidade de utilizar uma série de conhecimentos (inúteis?) adquiridos ao longo de toda a vida, fruto de sua eterna obsessão por all things comedy. Tudo isso foi parar lá, no show de TV. E com esse depoimento percebi que as pessoas cujo trabalho mais admiro costumam ter isto em comum: levar extremamente a sério aquilo que fazem, mas sem se levar muito a sério. Não todas, claro (alguém pensou no Miles Davis?). É, talvez o único ponto em comum entre todas elas seja mesmo a dedicação para com aquilo que fazem. Não se levar muito a sério - eis a arte, o bonus super combo extra special. Seinfeld e Oz compartilham essa qualidade.

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sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Nós em NY: uma Odisséia

Esta Odisséia começa assim bem blasée - o único estado de espírito que consigo sustentar por enquanto, sob pena de não conseguir atender mais ninguém nem traduzir mais nada caso pense friamente no que está para acontecer. Pensar fria e objetivamente, aqui, significa reconhecer que em pouco mais de um mês embarcarei em uma viagem que promete ser das mais uplifting ever. Se formulo qualquer pensamento a respeito, o mais friamente que seja, tomo consciência imediata do meu coração batendo mais forte no corpo inteiro. Por ora, portanto, é necessário não pensar, e sim trabalhar no que me resta até o final do ano - além de compartilhar com vocês o apartamento tão desenxabidinho onde iremos nos hospedar (é bom irem se acostumando ao estilo blasé a ser exibido nesta Odisséia até o Natal, salvo algum rompante proporcionado por uma expectativa musical - depois do Natal, porém, o estilo blasé deve se converter em seu oposto, isto é, o estilo tiete-histérico).

Com vocês, o AKA Central Park:


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O lugar mais deprimente de São Paulo nas semanas que antecedem o Natal

Os números não mentem, por qualquer lado que se os olhe: a Rua 25 de Março ganhou a emérita premiação concedida por este blog, com a ampla vantagem de um voto sobre os demais concorrentes - o que, se parece pouco, é só porque vocês não estão levando em conta que os votantes foram seis.

Ficam registrados, então, os parabéns a este lugar que prima pelo excesso de coisas e pessoas, justamente pela escassez de dinheiro da nossa gente.

Mas eleitores em potencial reclamaram da natureza da enquete, alegando que:

a-) todos os lugares concorrentes são deprimentes durante a totalidade do ano, não só nas semanas pré-natalinas;

b-) todos os lugares concorrentes são tão deprimentes, que o eleitor se confunde e prefere se abster;

c-) faltou a Rua Normandia entre as opções.

Sobre essas críticas, só me resta dizer: sim, sim e sim. Tudo isso é verdade. Tenho apenas dois adendos a fazer às críticas a e b:

a-) todos os lugares concorrentes são deprimentes durante a totalidade do ano, não só nas semanas pré-natalinas. É verdade; porém, assim como sabemos que a pobreza, além de constituir um sofrimento em si, reforça e realça, acentua e potencializa todos os demais sofrimentos (lição aprendida com o mestre que aniversaria hoje - parabéns, Paulino!!!) - também sabemos, por inferência, que o Natal reforça, realça etc. o PD (Potencial Depressor) de alguns lugares especiais.

b-) todos os lugares concorrentes são tão deprimentes, que o eleitor se confunde e prefere se abster. Sim, eleitores, mas vejam: a enquete pretendia apelar não apenas ao intelecto, mas às emoções mais profundas de vocês. Qual dos concorrentes, assim poderia ser lida a questão, é o lugar que mais náusea lhe imprime ao estômago? (O estômago nunca mente, lição aprendida com a Bel.)

O meu estômago, por exemplo, tinha resposta certa à pergunta. E já que não acredito na racionalização das escolhas, mas sim na justificativa intelectual a posteriori de uma escolha visceral e estomacal, passemos agora a uma análise ontológica dos lugares-candidatos divididos em duas categorias. São elas:

a-) Filiais do Inferno. É a luta pela sobrevivência em seu nível mais básico: a disputa pelo espaço. Pessoas competem por um lugar ao sol, à loja de celular, à fila do camelô, à fila das carnes, à fila para entrar na fila. Claramente, pertencem a este grupo a 25 de Março, o Shopping Center Norte, o Supermercado Bergamini e qualquer rua ou avenida da cidade no período das seis da manhã até as três da manhã do dia seguinte.

b-) Passeios Natalinos. Impera aqui não mais a luta pela sobrevivência, e sim a luta de classes. Poucas coisas parecem-me mais deprimentes do que morar em uma cidade cujas grandes opções de divertimento para os pobres no Natal seja tirar foto da Árvore do Ibirapuera (de resto, não muito mais bonita do que as árvores que eu mesma desenhava aos cinco anos de idade) - ou da decoração natalina do Shopping Iguatemi. A Árvore do Ibirapuera ganha pontos extras no PD por ser efetivamente feia; o Iguatemi ganha pontos por realçar ainda mais nitidamente a luta de classes.

*E antes que me digam que NY tem o Rockefeller Center e que se lá eu estivesse estaria tirando fotos da árvore toda pimpona, como pobre brasileira que sou - respondo que é verdade, mas que pelo menos em NY há uma cidade inteira bonita e bem cuidada à disposição das máquinas fotográficas dos pobres. Aqui os nossos pobres só têm o Shopping Iguatemi para fotografar.

** Na categoria conceitual deveria ter entrado também a Rua Normandia, cujas luzinhas não se acenderam em minha memória a tempo.

Feita essa exposição, resta a pergunta: qual o único lugar-candidato ainda não mencionado aqui?

A resposta revela o meu personal favorite: o Saldão das Casas Bahia, claro.

E ele não pertence a nenhuma das duas categorias em particular porque, como nenhum outro lugar em São Paulo às vésperas do Natal, o Saldão das Casas Bahia consegue conjugar em um só espaço a luta pela sobrevivência e a luta de classes - e, seguindo esse raciocínio, seria o lugar merecedor do prêmio.

O Saldão das Casas Bahia é a única Filial do Inferno considerada também um excelente Passeio Natalino - isto é, trata-se do único lugar insuportavelmente apinhado de gente que é ao mesmo tempo, e a despeito disso, tido como bom para se visitar e tirar fotos. As milhares de pessoas que se acotovelam na fila do crediário evidenciam a luta de classes à medida que ilustram o abismo existente entre a classe rica e o resto da população deste país: os pobres e a classe média disputam para ver quem vai pagar quanto, e em quantas vezes, enquanto os ricos passam o Natal bem longe dali.

***

Agora, antes que eu faça outra enquete tendenciosa, aproveito para dizer sem mais delongas que o comercial de TV mais deprimente destas vésperas de Natal sem dúvida alguma é o do Shopping Morumbi. E esta foi uma constatação triste para mim, pois o Shopping Morumbi é o único da cidade com o qual tenho alguma conexão afetiva. (A explicação oficial para isso é que eles têm uma super praça de alimentação; a verdadeira é que eu ia lá com o meu pai todo fim de semana quando pequena.)

Para quem ainda não teve o desprazer, o comercial, no melhor estilo lugar-de-gente-feliz (aliás, o Pão de Açúcar é a empresa que transpôs o conceito natalino de comercial para as propagandas do ano todo, mas isso é assunto para outro post), mostra grandes artistas da nossa música - Ed Motta, Paula Toller, Nando Reis, uma Ivete Sangalo genérica e provavelmente algum outro artista cujas artes agora me escapam - cantando em pungentes vibratos, strumming o violão com toda a energia, rindo e chorando ao mesmo tempo, nem ao menos sabendo como extravasar tanta emoção - a emoção de fazer compras no Shopping Morumbi. Com isso, o comercial também contribui para a explicitação da luta de classes: eu não sabia que as pessoas estavam tão pobres a ponto de não comprarem mais CDs - deixando, com isso, os já mencionados artistas igualmente pobres, tão pobres a ponto de precisarem ficar tão felizes num comercial, tudo para ganhar uns troquinhos de décimo-terceiro.

É nessas horas que tenho vontade de me mudar para alguma potência da ex-Iugoslávia (aqueles países que rendem ótimos jogadores de vôlei) e viver num chalé no topo de uma montanha plantando figos e pastoreando ovelhas. (Naturalmente, eu precisaria de um laptop com acesso à internet nessa montanha, até para eventualmente baixar alguma música do Ed Motta. É, o pior é isso: eu gosto um pouquinho do Ed Motta.)

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Coisas que eu achava que aconteceriam quando eu virasse adulta

1. Eu sempre teria um guarda-chuva na bolsa.

2. Eu sempre teria uma folha de zona azul no carro.

3. Eu sempre teria leite, pães, frutas, queijos e iogurtes em casa para o café da manhã.

4. Eu sempre tomaria café da manhã.

5. Eu sempre estaria bem arrumada e de unhas feitas.

6. Eu sempre passaria creme hidratante no corpo ao me levantar.

7. Eu sempre pagaria todas as contas em dia.

8. Eu sempre ligaria para os amigos nos aniversários.

9. Minhas gavetas estariam eternamente organizadas.

10. Meu guarda-roupa idem.

11. Meus pensamentos também.

12. Eu nunca me sentiria aliviada quando um paciente difícil faltasse à sessão.

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segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Persecutoriedade

Estou tentando desesperadamente marcar um horário no salão de beleza, e ninguém me atende. Será vingança contra o texto aí de baixo?

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domingo, 2 de dezembro de 2007

Outra experiência antropológica: o salão de beleza

Dez anos de observação participante semanal em salões de beleza os mais variados constituem a principal fonte de informações para o estudo etnográfico que apresentamos a seguir, visando a descrição minuciosa dos tipos complexos que compõem a população prestadora de serviços destes estabelecimentos. Foge ao escopo do presente trabalho investigar a população consumidora destes serviços - qual seja, a clientela -, questão que pretendemos abordar no doutorado.

(Ou, se preferir, leia este texto como se fosse um teste de personalidade: que tipo de profissional da beleza você é?)

***

O cabeleireiro gay que se faz de hetero. De maneiras exageradamente contidas e sempre dando um jeito de encaixar a palavra "esposa" em qualquer assunto que se apresente, este cabeleireiro entrega a real natureza de seus sentimentos luxuriosos ao não reparar no decote da gostosa que acaba de adentrar o salão.

O cabeleireiro hetero que se faz de gay, isto é, fala alto, mexe bastante os braços e usa os adjetivos "fofa" e "bonita" como substantivos. Para ele, isso é o que basta para ser considerado homossexual pela maioria das clientes - e, portanto, dotado de um senso fashion superior ao restante da humanidade.

O cabeleireiro que se faz de cantor sertanejo. De preferências sexuais abstrusas, este cabeleireiro vê a profissão apenas como a plataforma que o alçará ao estrelato. Sendo assim, passa o dia ensaiando a performance que o levará ao Big Brother ou praticando o falsete que o levará à dupla sertaneja cujo segundo integrante acaba de falecer, que Deus o tenha.

O ajudante adolescente que se faz de moderno. Seus cabelos são uma instalação de arte pós-moderna; seu rosto, uma profusão de perfurações causadas pela acne ou por brincos e pinos diversos. A observadora-participante a princípio não dá nada por ele - até que ele lhe conduz ao lavatório e começa a massagear a sua cabeça. A experiência é tão, hmm, participante que depois de dez minutos a observadora começa a cogitar pedi-lo em namoro - momento no qual a massagem acaba, o adolescente sai de trás do lavatório e a observadora volta à dura realidade da sua pesquisa antropológica.

A manicure que se faz de safada. Vestindo sempre dois números a menos do que lhe seria cabível, a manicure que se faz de safada dispara uma média de dois comentários por minuto com referências sexuais tão sutis quanto os comerciais das Casas Bahia. "Você viu o tamanho do pé do (nome do cliente)?" e "Hoje eu estou necessitada!" estão entre as mais comuns.

A manicure que se faz de santa. Mãe e avó, faz frango com macarronada para a família aos domingos e é a única em todo o salão que responde aos comentários da manicure safada. Para tal, geralmente recorre aos clássicos "pára, Fulana!" e "ai, não sei do que você está falando!".

A manicure que se faz de superior. Mantém-se alheia às conversinhas fúteis entre as manicures safada e santa, buscando, ao invés disso, discutir literatura espírita com as clientes. Acha a injustiça social um absurdo e é eleitora fiel do Maluf.

A recepcionista desinformada que se faz de informada. A recepcionista desinformada invariavelmente anota o nome da observadora, cliente de meia década da manicure Maria, na agenda da cabeleireira Mara. Não contente, lá de vez em quando tenta convencer a observadora de que seu sobrenome na verdade se escreve com um L só, pois é óbvio que ela jamais o anotaria de maneira incorreta.

A cabeleireira que se faz de psicóloga, isto é, ouve três frases a respeito da vida da observadora e faz questão de compartilhar sua grande experiência de vida e vasta sabedoria com conselhos e lições que vão desde a flutuação do mercado financeiro à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Freqüentemente entende também de astrologia. Com tantos conhecimentos, sempre tem muito a dizer; costuma ser bem menos requisitada do que o ajudante adolescente.

A cabeleireira (que se faz de?) grávida. Todo salão de beleza possui : a) uma cabeleireira grávida; ou b) uma cabeleireira que está de licença porque está grávida; ou c) uma cabeleireira que acabou de voltar da licença por ter estado grávida; ou d) uma cabeleireira que está morrendo de medo de descobrir que está grávida. Qualquer que seja o caso, todo o salão se mobiliza em função da gravidez do trimestre - sim, pois a cada trimestre a grávida do salão precisa ser renovada.

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