Sexta-feira
Tá, então o meu superego falou mais alto e eu fiquei com dó de vocês, expostos a um poema cuja imagem mais significativa é a de um pêlo masculino enroscado num chenile qualquer. Passemos, portanto, à alegria que me aguarda na sexta-feira, quando ouvirei, na voz da Luciana Souza e nas mãos de instrumentistas capitaneados pelo Joni-expert Larry Klein, a música cuja letra compartilho com vocês a seguir.
É uma letra que tem mais a ver comigo – com este momento da minha vida – do que eu gostaria de supor. Mas, deixando em suspenso por um instante a minha relação pessoal de amor com a música, vocês hão de convir comigo que “toma-se um gênio” (no caso, uma gênia – e por que será que a gente não pode falar assim em português, “it takes something”?) para fazer de uma canção que brada a plenos pulmões “Love is gone!” uma canção otimista. E esta é. Transpira esperança e novas possibilidades.
E a escolha das palavras? “Clutching the night to you like a fig leaf” – nunca reparei no formato, cor ou textura de uma folha de figo, mas as palavras soam just right. Para mim, o importante é a noite sendo colhida de uma árvore e devorada.
E as imagens? “Quando as últimas luzes despem as sombras desta estranha e nova carne que encontrastes...” Nem uma tradução tosca consegue suprimir a força original destes versos. E a canção escrita no espírito, e o superego (segunda aparição dele neste post... O que será que está acontecendo?) a responsabilizar o sujeito pela indiferença dos amigos? E a pick-up station, que pode ser qualquer lugar?...
A ambigüidade, como não. A mulher que corre aos cobertores (ahá! Existe pelo menos um ponto em comum entre o meu poema e a letra da Joni!) para “lay down” (provocar, estabelecer) uma (boa) impressão e... solidão. Ela estava sozinha ou acompanhada? Não importa o fato: sem dúvida, estivesse ela provida ou desprovida de sua estranha carne recém-adquirida – ela estava sozinha. Principalmente quando todo o processo de seleção do calor e da beleza foi narrado como um tantra, tantas vezes repetido e tantas vezes encerrado pela longa e penosa constatação do mesmo sentimento – solidão.
(A solidão é marcada por uma nota mais grave que todas as outras.)
E o estranhamento? O roçar nesta pessoa desconhecida: “Still somehow the slightest touch of a stranger / Sets up a trembling in my bones”. Ok, este trecho é de outra música, mas não consigo não confundir as duas. O toque de uma pessoa estranha, boa ou fria – principalmente num momento de solidão, ou mesmo de hejira – eletriza. Estimula e sensibiliza.
E os contrastes? O meu preferido é a volta para o A, ao final (a melodia é quase a mesma na primeira e na última estrofes): é preciso um longo interlúdio instrumental para que haja uma transformação do decreto “Love is gone” em alguma coisa outra. Não é uma transformação simples – tristeza não tem fim; felicidade, sim –, mas recupera o que é essencial da primeira estrofe.
E, principalmente, os dois versos iniciais. Será que, ao fim e ao cabo, isso é tudo que nos resta? Is that what it all comes down to? O tempo passa, marcado por amores e estilos de roupas. Se assim for, hei de lembrar-me do atual momento como repleto de cores e vazio de sentimento...
Mas não precisa ser assim – só se eu quiser que seja (e eu não quero). Afinal, it all comes
DOWN TO YOU
(Joni Mitchell)
Everything comes and goes
Marked by lovers and styles of clothes
Things that you held high
And told yourself were true
Lost or changing as the days come down to you
Down to you
Constant stranger
You’re a kind person
You’re a cold person too
It’s down to you
You go down to the pick-up station
Craving warmth and beauty
You settle for less than fascination
A few drinks later you’re not so choosy
When the closing lights strip off the shadows
On this strange new flesh you found
Clutching the night to you like a fig leaf
You hurry
To the blackness
And the blankets
To lay down an impression
And your loneliness
In the morning there are lovers in the street
They look so high
You brush against a stranger
And you both apologize
Old friends seem indifferent
You must have brought that on
Old bonds have broken down
Love is gone
Oh love is gone
Written on your spirit this sad song
Love is gone
Everything comes and goes
Pleasure moves on too early
And trouble leaves too slow
Just when you’re thinking
You’ve finally got it made
Bad news comes knocking
At your garden gate
Knocking for you
Constant stranger
You’re a brute – you’re an angel
You can crawl – you can fly too
It’s down to you
It all comes down to you
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