Suíte Elaborações
Namoro
Dia desses, em pleno desespero pós-término de namoro, ouço os seguintes conselhos de uma pessoa que, embora pouco me conheça, gosta de mim o suficiente para se deixar tocar por meu sofrimento:
“Não fica assim, não vale a pena. Ele não merece o seu choro. Você vai arrumar outro muito melhor.”
Este é apenas o segundo namoro em minha vida que chega ao fim. Mas, após ouvir as três declarações acima, tive um insight: se dez vezes eu namorar e dez vezes o namoro acabar, dez vezes ouvirei a tríade: não vale a pena; ele não merece; outro melhor virá.
E por quê? Porque – é incrível – funciona. Imediatamente me acalmei. “É isso mesmo!”, pensei. “Ele não merece!”, resmunguei comigo mesma, indignada!
***
PÁRA TUDO.
Assustaram-me a rapidez e a indignação com as quais, mentalmente, acatei os conselhos. De repente, transformei-me na mulher despeitada e desrespeitada, vítima de grande ofensa, calúnia ou difamação.
Mas, um instantinho só. Terminar o namoro foi uma decisão minha, tanto quanto dele. E o André é tão cafajeste quanto eu sou uma bailarina. Que mal fez ele, então, para eu me sentir tão ofendida?
Foi aí que me dei conta. Não dele, mas de mim: da parte de mim que se sentiu ultrajada. Ainda não a conheço muito bem. Sofro intensamente, porém, os efeitos de seus desvarios.
Estamos falando da parte de mim que quer ser a deusa do universo. (Qualquer universo.) E, para essa deusa em potencial, qualquer coisa menor do que a divindade é cafajestagem das baixas.
E, com o fim de um relacionamento (ou seria essa a causa do fim? But I digress.), inevitavelmente sobrevém a sua abjuração.
Sim, meus caros. Passar de namorada a ex é passar de fina camisa de linho costurada sob medida a camiseta da C&A. É passar, de mesa talhada em madeira maciça, a escrivaninha de compensado da Tok Stok. É ver-se transformada, de filme cambojano que ninguém viu na Mostra Internacional de 97, a mais um episódio de Friends.
É mudar o tipo de artigo que me acompanha. Não sou mais a namorada. Sou uma ex-namorada, dentre outras.
Naturalmente, tais mudanças não são, em si, ruins. Afinal, promoções da C&A são sempre bem-vindas, meu consultório conta com a presença de uma linda escrivaninha Tok Stok e prefiro Friends a 90% da programação atualmente em cartaz no Espaço Unibanco.
Todavia, passar de artigo de luxo a artigo de consumo de massa é sempre um golpe no próprio narcisismo. Tipo: primeiro o homem descobriu que a Terra é só mais um planetinha marreta girando em torno do Sol. Depois, que ele próprio é uma criatura nem mais nem menos animalesca do que um macaco. Em seguida, que ele não sabe por que faz boa parte do que faz (isto é, o inconsciente existe). E, finalmente, o homem descobriu que ele pode virar um reles ex a qualquer instante.
Mas, sabem do que mais? Aquela parte de mim da qual lhes falei, a da deusa em potencial – ela é importante, viu. Ela é importante e sempre precisará ser respeitada, em qualquer relacionamento em que eu estiver.
Mas ela não é a mais importante. Definitivamente, não me deixo dominar por ela.
Então, queridos conselheiros que tanto me querem bem... Desculpem aí, mas sofrer vale a pena, sim. Vale a pena porque o meu ex-namorado (olha só, é possível juntar artigo definido com o prefixo ex!) é lindo, querido e fabuloso. E terminar um relacionamento com ele merece todo o sofrimento do mundo.
Agora, com uma coisa eu concordo. É a terceira declaração-conselho-profecia. Mais uma vez:
“Você vai arrumar outro muito melhor.”
Com um retoquezinho aqui, outro ali, isso vira:
“Coisas melhores virão."
Agora, sim. Coisas – quais, não faço idéia – melhores virão. Disso, amigos, não tenho nenhuma dúvida.
Marcadores: elaborar, recordar
5 Comentários:
pois é, Cami... é duro quando "qualquer coisa menor do que a divindade é cafajestagem das baixas", pois não sobra muita coisa à altura de nossa magnitude... Por outro lado, fico feliz quando percebo que o nosso "euzinho" se desdobra, na verdade, em vários euzinhos, dentre eles a deusa em potencial (outro jeito de falarmos da terceira ferida narcísica que vc citou). Mas concordo com vc: ela não é, de fato, a parte mais importante, embora tenha sim de ser levada em conta, assim como mandada ao inferno, noutros momentos!
Mudanças....
São parte da vida.
Sem elas não teria graça. Tudo seria perfeito demais.
Lalas
Eu acho, de coração, que a gente se torna menos vulnerável às cafagestagens quando percebemos que o que nos faz divinas não é simplesmente o olhar de um outro.
Beijos!
Camila,
Parabéns pelo blog. Bom te ler, bom comentar. Sobre a história de ser "ex" te colocar em uma condição de `segunda classe` ... não sei não. Acho que depende muito de QUEM você é "ex". Você tem pedigree. Ser "ex" de gente legal dá até um certo status. :) Beijão linda.
Bel: em que medida levá-la em conta e a partir de que ponto mandá-la ao inferno, eis a questão. Lalas: é isso aí, que de perfeição já basta a Gisele Bündchen. Mari: de coração, concordo com você. Mas há muito que deixei de acreditar num ideal de auto-suficiência: olhar do outro é bom sim, e sempre será, em alguma medida, necessário. De preferência, não muito. Cintia: status, jura? Bom, então devo estar bem aos seus olhos, pois sei que você adora o André... Beijos a todas!
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